Mesmo com posição do Procon, Apple ainda não está fornecendo carregadores no Brasil
No início de dezembro, fez-se muito alarde sobre uma notificação do Procon-SP que afirmava que a Apple deveria fornecer carregadores de celular para todos os clientes que compraram o aparelho sem um na caixa.
Mas desde então, o que aconteceu? Que fim deu tudo isso? A Apple está mesmo fornecendo os carregadores afinal?
O Blog do iPhone apurou alguns fatos e descobriu que a posição do Procon-SP ainda não surtiu nenhum efeito prático na vida dos clientes da maçã.
A posição do Procon-SP
No final de outubro, o Procon-SP notificou algumas fabricantes de celular no Brasil para saber mais informações sobre a nova política de vender o celular sem entregar o carregador na caixa.
A primeira a fazer isso foi a Apple, mas outras marcas (como Xiaomi e Samsung) já deram a entender que seguirão a mesma tendência.
Não satisfeito com a resposta da maçã, o Procon-SP emitiu um novo comunicado, dizendo que estaria disposto a entrar com uma ação civil pública coletiva caso a empresa não aceite fornecer gratuitamente o carregador aos clientes que solicitarem.
Isso fez muita gente ficar empolgada e até virou notícia em sites internacionais.
Mas afinal, o que aconteceu depois disso?
A posição da Apple
O Blog do iPhone entrou em contato com a Apple no Brasil e o que descobriu é que a empresa diz ainda não ter recebido nenhuma notificação oficial por parte do Procon-SP.
Todo o cliente que comprou um iPhone sem carregador na caixa que entre em contato com a Apple para receber um carregador gratuitamente, se depara com a informação de que não estão fornecendo nada no momento.
Portanto, sem o Procon efetivamente notificar a Apple de forma oficial, nada irá mudar na situação do consumidor.
Mas qual é realmente o poder do Procon-SP sobre isso?
Procon não tem poder jurídico
Por mais que o Procon-SP tenha feito um grande alarde sobre o fato da Apple não fornecer carregadores na caixa do iPhone, o fato é que ele não tem poder para exigir nada, ao contrário do que alguns sites de notícias afirmaram.
Primeiro porque cada Estado da nação possui seu próprio Procon, independente, e com atuação local. Cada um tem uma natureza jurídica diferente: alguns são autarquias, outros são ligados ao Ministério Público ou à Assembleia Legislativa.
Então, qualquer decisão é limitada aos consumidores daquele Estado. As atitudes tomadas não abrangem, a princípio, o resto do território nacional.
Outros dois Procons (SC e RJ) também emitiram notificações similares para a Apple.
Além disso, a entidade não tem poder jurídico. Ela é um órgão extrajudicial, que não faz parte do Poder Judiciário nem do Poder Legislativo e portanto não tem o poder de emitir sentenças.
Ela até pode fiscalizar e emitir multas, mas somente em casos em que a empresa claramente fere uma legislação existente, cometendo um crime.
E no caso da Apple, não há nenhuma lei em vigência que a obrigue a vender o iPhone com um carregador junto.
O que diz a lei
É um caso em que há bastante divergência.
Segundo alguns especialistas, a venda de celulares com carregador é uma prática de mercado, mas não uma obrigação legal. Não há na legislação brasileira nada que diga que a fabricante é obrigada a vender um celular com um carregador de tomada.
A prática das empresas de celular de venderem os aparelhos junto com a fonte de energia e acessórios como fones de ouvido é praxe, mas não uma obrigatoriedade de mercado. É possível comercializar o aparelho de telefone apenas com o cabo carregador compatível sem infringir nenhuma lei, mas não é uma prática usual.
De fato, o adaptador de tomada não é crucial para o carregamento do celular. Já o cabo sim, principalmente por precisar de um conector proprietário (Lightning).
Já outros ressaltam que nem mesmo o termo “carregador” é muito claro. Há quem chame o simples cabo USB de carregador, e o outro de “adaptador de tomada”. Nós mesmos do BDI recebemos diversas críticas quando tentamos mostrar a diferença dos dois acessórios em nosso Instagram.
Ver essa foto no Instagram
Neste caso, o cabo USB que vem na caixa pode ser considerado suficiente para permitir a recarga de bateria do aparelho, pois é possível conectar em qualquer fonte de energia com USB-C. Muitos computadores atuais, por exemplo, estão vindo com este tipo de conexão.
Mas afinal, o Procon pode ou não mudar alguma coisa?
Quando o Procon-SP decidir notificar a Apple (coisa que ainda não tinha feito até o momento em que este artigo estava sendo escrito), a única coisa que ele poderá fazer é ajudar os consumidores a entrar com uma ação cível caso a empresa se recuse a fornecer gratuitamente o carregador.
Mas isto não é certeza de que a Apple perderá a causa.
A empresa poderá recorrer, mostrando que não está ferindo nenhuma legislação vigente. E acredite: os advogados da Apple sabem muito bem o que fazem e seria um páreo duro vencê-los nos tribunais.
E mesmo que a disputa chegasse nesta esfera e a Apple perdesse a causa, dificilmente a empresa adotaria como padrão o fornecimento gratuito de carregadores para quem comprou o iPhone. Isso seria tratado individualmente para quem entrar na justiça.
Autopromoção do Procon-SP?
A principal pergunta que devemos fazer é: se o Procon-SP realmente está preocupado com esta questão, por que o órgão ainda não notificou oficialmente a Apple?
Por que tanto alarde na imprensa, se efetivamente nada é feito?
Há quem diga que tudo seja mais para chamar a atenção para o Procon-SP do que uma real preocupação com o consumidor. Isso porque não é a primeira vez que a entidade paulista usa de sensacionalismos para virar notícia na mídia.
Em fevereiro de 2020, o então diretor executivo do Procon-SP divulgou um vídeo alarmista no canal da entidade, reproduzindo uma notícia falsa que circulava em grupos de WhatsApp desde 2019. Ele afirmava que “hackers” poderiam roubar todos os dados do celular apenas ligando para a pessoa.
Ou seja, o Procon-SP transformou uma corrente de WhatsApp em uma corrente em vídeo, espalhando uma informação inverídica.
Não queremos acreditar nisso, mas neste caso da treta com a Apple, tudo pode ser apenas mais uma oportunidade do órgão chamar a atenção para si, sem muito resultado prático.
Esperemos que não seja isso.
O que devo fazer então?
Por enquanto, o consumidor comum que comprou um iPhone sem carregador na caixa não pode fazer muita coisa.
Se entrar em contato com a empresa, ouvirá de que poderá comprar o carregador separadamente, além de todo um discurso ecológico.
A não ser que resolva entrar na justiça contra a Apple, para tentar reaver o carregador que não recebeu. Mas até agora não há precedente jurídico que apoie uma decisão favorável para o cliente.
Se você resolver entrar na justiça, nos conte, para acompanharmos o caso e ajudarmos outros consumidores.