Ex-funcionários da Apple dizem que filme Jobs é mais ficção do que realidade
É normal que todo o filme “baseado” em histórias reais acabe em alguns pontos romantizando passagens históricas, para que a narrativa seja melhor adaptada para o consumo em massa. Momentos chatos são transformados em conflitos para que fiquem interessantes para quem está assistindo e isso sempre foi assim. Ao contar a história do Titanic, por exemplo, James Cameron inventou um romance fictício entre dois jovens para que ninguém dormisse no cinema.
Porém, alguns ex-funcionários da Apple declararam que o filme Jobs usa demais este tipo de artifício, fazendo com que a narrativa final não seja muito precisa com a realidade em diversos pontos.
Daniel Kottke e Bill Fernandez trabalharam junto com os dois Steves desde os primeiros dias da Apple, ainda na garagem da casa dos pais de Jobs. Eles deram uma entrevista para o site Slashdot falando sobre o filme e sobre diversas passagens no início da companhia, da forma como elas realmente aconteceram.
Fernandez disse que ainda não viu o filme e nem pretende ver, pois acha bizarro ver outra pessoa interpretando Jobs. Já Kottke assistiu e diz ter gostado bastante da interpretação de Ashton Kutcher, mas achou injusto terem feito um retrato de Steve Wozniak como se ele não tivesse a mesma visão de Steve Jobs.
Algumas cenas foram totalmente fabricadas, como aquela em que Woz pede demissão da Apple.
Na realidade, Woz sempre foi bem-vindo e encorajado a fazer parte do projeto Macintosh, mas então aconteceu o acidente com o aeroplano e ele simplesmente não voltou mais.
O acidente de Woz (no qual ele perdeu sua mulher e foi marcante para a sua vida) nem mesmo foi mencionado no filme.
Alguém precisa fazer um filme sobre o Woz também [risos]. Espero que isso aconteça um dia.
Segundo Daniel, o ator Noah Wyle fez um personagem muito mais próximo do Steve Jobs real no filme Piratas do Vale do Silício.
A íntegra da entrevista (em inglês) pode ser vista no site original.
Já Steve Wozniak (uma das cabeças brilhantes da dupla que fez nascer a Apple) também comentou sobre o filme para o Gizmodo US, afirmando que como entretenimento, cumpre o seu papel, mas ele mesmo assim não recomenda assisti-lo. Ele associa os vários erros históricos do filme à imagem que o ator Ashton Kutcher tem de Jobs, que inclusive acusou Woz de estar sendo pago pela Sony para falar mal deste longa (Woz foi convidado para fazer consultoria no roteiro do próximo filme biográfico de Jobs, inspirado na obra de Walter Isaacson). Mas o co-fundador rebate as críticas:
Isto demonstra como Ashton ainda está no personagem. Qualquer filme teria me pagado para dar consultas, mas Jobs já tinha um roteiro escrito. Não posso retirar a liderança criativa de outra pessoa e eu não estava animado com o script do filme. Mesmo assim, esperava que fosse um grande filme.
Em relação a comprometer meus princípios por dinheiro, vou acrescentar um detalhe deixado de fora do filme. Quando a Apple decidiu não premiar os primeiros amigos que a ajudaram, dei a eles grande parte das minhas ações, pois achei que isso era o certo. E fiz o possível para 80 outros funcionários obterem algumas ações antes da abertura em Bolsa, para que eles pudessem participar da riqueza.
Me senti mal por várias pessoas que conheço muito bem e foram caracterizadas de forma errada nas suas interações com Jobs e com a empresa. O filme termina muito bem com o grande Jobs finalmente chegando a um produto de sucesso (o iPod) que mudou muitas das nossas vidas. Sou muito grato a Steve por sua excelência na “i-Era”, e por sua contribuição para a minha própria vida com excelentes produtos, mas o filme retrata-o como se ele tivesse essa visão já no passado.
Ou seja, o filme deve ser divertido para quem já conhece a história, mas não deverá nunca ser tomado ao pé da letra, assim como já era o filme “Piratas do Vale do Silício“.
Ele estreia no Brasil no dia 6 de setembro.