Craig Federighi também tenta justificar o atraso da Apple Intelligence
Empresa diz que quer trazer a inteligência artificial generativa para o iPhone com cautela e responsabilidade.
Depois que Mark Gurman revelou que a Apple está cerca de dois anos atrás da concorrência no desenvolvimento de inteligência artificial, a empresa parece ter iniciado uma série de justificativas públicas.
No último domingo, Tim Cook, CEO da Apple, concedeu uma entrevista ao The Wall Street Journal para abordar o tema.
Agora, foi a vez de Craig Federighi, vice-presidente sênior de engenharia de software da Apple, compartilhar sua versão sobre o porquê da demora no lançamento da Apple Intelligence.
A abordagem cuidadosa da Apple
Federighi destacou que o desenvolvimento da Apple Intelligence não é apenas uma corrida para lançar novos recursos rapidamente, mas sim um projeto de longo prazo que visa integrar a IA de maneira profunda e responsável nos dispositivos da Apple.
A empresa reconhece o atraso em comparação a concorrentes como Google e Microsoft, mas enfatiza que esse atraso é deliberado.
A principal justificativa de Federighi é que a Apple está priorizando a privacidade e a segurança dos usuários.
Diferente de outras grandes empresas que dependem da nuvem para processar dados e oferecer recursos avançados de IA, a Apple opta por processar grande parte dessas operações diretamente nos dispositivos dos usuários.
Isso significa que, enquanto a ChatGPT e outros modelos de linguagem enviam informações dos usuários para servidores em nuvem, a Apple está desenvolvendo uma abordagem híbrida.
Federighi explicou que, em casos que requerem mais poder de processamento, a Apple utiliza o que chama de Private Cloud Compute, que processa dados criptografados para garantir a privacidade.
Privacidade como prioridade
Um dos pontos mais enfatizados por Federighi foi a importância da privacidade para a Apple. Ele ressaltou que a maior diferença entre a Apple e outras empresas de tecnologia está na forma como lidam com os dados dos usuários.
Enquanto muitas empresas coletam, armazenam e processam grandes volumes de dados para refinar suas soluções de IA, a Apple prefere limitar ao máximo a quantidade de informações que passam por seus servidores.
Ele reconheceu que essa abordagem mais cautelosa pode parecer lenta para quem observa o mercado, mas é essencial para garantir que a Apple Intelligence respeite a privacidade dos usuários.
Federighi reforçou que as informações utilizadas para treinar os modelos de IA da Apple são criptografadas e descartadas após o uso, sem a possibilidade de acesso ou armazenamento pela empresa.
Integração profunda e personalizada
Outro ponto chave na explicação de Federighi é a visão da Apple sobre o papel da IA em seus dispositivos.
Em vez de criar apenas mais um assistente virtual ou chatbot genérico, como o ChatGPT, a Apple está focada em integrar a inteligência artificial de maneira profunda e personalizada em sua linha de produtos.
Federighi afirmou que, para a Apple, a verdadeira força da inteligência artificial está na capacidade de compreender o contexto pessoal dos usuários e agir com base nessas informações.
“Não estamos interessados em construir algo que não conhece o usuário”, afirmou Federighi, sugerindo que a Apple Intelligence será capaz de oferecer respostas e soluções personalizadas, utilizando dados armazenados localmente nos dispositivos para garantir precisão e relevância.
Limitando a manipulação de fotos com IA
Craig Federighi destacou uma abordagem cautelosa da Apple em relação à manipulação de fotos com IA.
Ele mencionou que, embora a demanda por ferramentas que permitem remover objetos indesejados das fotos tenha crescido, a empresa se preocupa em preservar a integridade das imagens e manter o compromisso com a veracidade.
A funcionalidade Limpeza (Cleanup), que permite apagar pequenos detalhes como garrafas d’água ou microfones, é um exemplo de como a Apple equilibra as necessidades dos usuários com a responsabilidade de manter a autenticidade fotográfica.
Federighi explicou que a empresa teve debates internos sobre até que ponto essas edições deveriam ser permitidas, ressaltando que é essencial que as fotos continuem sendo representações confiáveis da realidade. Ele afirmou:
“Houve muitos debates internos. Queríamos facilitar a remoção da garrafa d’água ou do microfone? Porque aquela garrafa estava lá quando você tirou a foto.”
A preocupação de Federighi vai além da simples remoção de objetos.
Ele frisou que a Apple entende a importância histórica da fotografia como um meio de registrar momentos reais e, por isso, a empresa é cuidadosa para não transformar suas ferramentas de edição em instrumentos que criam “fantasias”.
Essa abordagem é bem diferente da adotada por concorrentes como a Samsung, que é capaz de colocar digitalmente a imagem pré-pronta de uma lua em fotos tiradas com seu celular.
Essa responsabilidade está enraizada na filosofia da empresa de fornecer tecnologia que respeita a verdade dos fatos capturados:
“Estamos preocupados com a grande história da fotografia e como as pessoas veem o conteúdo fotográfico como algo em que podem confiar, indicativo da realidade.”
Além disso, para garantir a transparência no processo de edição, a Apple adotou a prática de atualizar os metadados das fotos alteradas.
Isso permite que, mesmo após o uso da função Limpeza, seja possível verificar que a imagem foi modificada, preservando a confiança nas imagens.
Com isso, fica claro que, para a Apple, o uso de IA na manipulação de fotos deve ser feito com parcimônia, sempre respeitando a linha entre melhorar a qualidade visual e alterar a verdade da imagem.
O caminho para o futuro
Federighi deixou claro que a Apple não está correndo para ser a primeira no mercado de IA, mas sim para ser a empresa que faz isso da maneira certa.
O desenvolvimento da Apple Intelligence é visto como um projeto de longo prazo, com melhorias sendo lançadas de forma gradual ao longo dos próximos anos.
A Apple está focada em garantir que cada nova funcionalidade esteja alinhada com seus princípios de privacidade e segurança, algo que é crucial para manter a confiança dos consumidores.
Embora o mercado de tecnologia esteja avançando rapidamente com soluções de IA, a Apple aposta que sua abordagem cuidadosa será recompensada.
“Não se trata de lançar um produto e pronto. Estamos construindo algo que evoluirá ao longo de anos, até mesmo décadas”.
Gerenciando o atraso
Não há dúvidas de que a Apple não viu o bonde da IA generativa chegar e por isso hoje não é considerada um player de destaque neste segmento.
Mas ao mesmo tempo, querer correr atrás com pressa e descontroladamente, como estão fazendo tantas outras empresas, não é o melhor caminho.
O melhor é mesmo admitir que perdeu a largada, mas trabalhar com responsabilidade e coerência para entregar um produto bem acabado e funcional para seu consumidor.
Afinal, é isso que os usuários da maçã estão acostumados.
A íntegra da entrevista (com possibilidade de visualizar legendas traduzidas para o português) pode ser vista abaixo: