Opinião

[opinião] Analistas decepcionados com a Apple precisam trabalhar melhor

Quando o assunto é a Apple, coisas se repetem com uma exatidão tão grande que ficam até engraçadas.

No texto a respeito dos resultados fiscais da Apple, eu fechei a matéria dizendo “Agora vamos ver como os analistas conseguirão transformar estes números em más notícias a partir de amanhã“.

Mas eu subestimei o poder dos analistas (e dos sites que acreditam neles). Não foi preciso esperar até o dia seguinte para que as matérias assim começassem a aparecer.

Existem uns ciclos engraçados para a Apple.

Na Revista iThing deste mês nós tratamos de um deles: o dos rumores.

Especialmente quando o assunto é o iPhone, o ano é dividido entre os 9 meses de rumores sobre o novo iPhone antes do seu anúncio, seguidos de 3 meses de notícias sobre o iPhone real depois que ele é anunciado¹.

Quando o interesse pela realidade começa a se esvair, voltam as notícias de rumores, reiniciando o ciclo.

Já quando o assunto é a grana da Apple, existe um outro ciclo, que é o ciclo das expectativas com base em avaliações de analistas.

A cada 3 meses a Apple faz uma conferência telefônica e anuncia os resultados financeiros do último trimestre fiscal.

Nos dias anteriores ao anúncio, analistas divulgam as suas estimativas para o que vai acontecer, e a imprensa usa estas estimativas como base para determinar se a Apple vai bem ou não.

Não é muito diferente de, digamos, um bolão da Copa. Ontem, antes do anúncio, a Forbes até divulgou uma tabela enorme centralizando as previsões de inúmeros analistas. A coisa é profissional!

O anúncio dos resultados fiscais funciona assim: Tim Cook e o Diretor de Finanças (antes Peter Oppenheimer, agora Luca Maestri) falam sobre a renda e o lucro da Apple (geralmente mostrando um crescimento significativo em relação ao ano anterior), informam os números das unidades vendidas de cada categoria de produtos da Apple, e terminam a ligação respondendo às (ou se esquivando de) perguntas de analistas sobre planos e o futuro da Apple.

Foi em uma dessas perguntas que Tim Cook se irritou com um investidor (que havia pedido que a Apple só fizesse coisas que tivessem lucro garantido) e recomendou a ele que vendesse suas ações da Apple.

Logo que termina o anúncio financeiro, começa a proliferação de notícias que trazem títulos como “Apple frustra investidores em anúncio de resultados fiscais“, “Receita da Apple fica abaixo do estimado“, “Apple fatura menos do que analistas previram“, etc.

E toda vez eu penso a mesma coisa: se a cada três meses os resultados da Apple ficam abaixo das estimativas, será que o problema aí é quem está estimando?

Porque é fácil chutar um número e depois dizer que “eles ficaram abaixo”.

Especialmente em uma época e em um meio em que nenhuma informação é checada, e nada precisa de muita base pra virar notícia.

Ontem a Folha publicou uma matéria que dizia “Receita da Apple fica abaixo do estimado“, que eu usei de exemplo lá em cima.

Resolvi ler o texto para entender de onde havia vindo aquela informação, e lá diz que Wall Street esperava que a Apple vendesse U$38 bilhões, mas ela só havia vendido U$37,4 bilhões.

Aí eu pergunto. Wall Street quem?

Essa expectativa existia com base em que cálculos? Não dizia.

A matéria também informava que a margem bruta cresceu além do esperado (sem citar qual era o esperado), mas é claro que isso não virou o título da notícia.

Os resultados de ontem estão muito longe de serem ruins.

Ruins, por exemplo, foram os resultados que a Microsoft também anunciou ontem. Ela comprou a Nokia por U$7 bilhões, a compra gerou retorno de U$2 bilhões, e deu um prejuízo de U$700 milhões.

Para piorar as coisas, a ela já havia anunciado na semana passada que iria demitir 18.000 funcionários, sendo que 12.500 deles são funcionários da Nokia que foram absorvidos pela Microsoft após a compra da empresa finlandesa.

Isso sim é decepcionante. Um crescimento de 6% em relação ao mesmo período do ano anterior não é.

Analistas sempre foram um problema.

Usar relatórios de fornecedores pra prever produtos, e prever vendas e lucros dos produtos que de fato existem se baseando em dados voláteis é de uma desonestidade atroz.

Pior ainda é fazer o leitor de besta a fim de tentar conseguir uns cliques a mais para o site.

Para não generalizar, é claro existem muitos analistas corretos, que sabem da responsabilidade que carregam, e fazem seus trabalhos direito.

Mas estes não costumam aparecer muito. Eles preferem trabalhar.

Já os outros adoram dar entrevistas com suas previsões inventadas por aí, talvez pela vaidade de verem seus nomes nas notícias.

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